sexta-feira, 20 de março de 2015

A arte do grito



                   Ao som de Fado, mais um desabafo:


Como em 2006 quando comecei este blog a sensação é a mesma: gritar, gritar para um buraco virtual o que penso, o que acho - em um mundo que a fala só é dada a base de grito (metafórico) pelos que não são ricos, nem famosos e muito menos esteriotipados em suas categorias sociais de moda (correnteza esta que leva as pessoas a falsear seus próprios gostos para mais uma vez se sentir aceito). 


Com a experiência de 2015, reconheço* as relações, os encontros, os círculos (grupos, ghettos) e me sinto só, solitária, mas não sozinha. Só porque não sou boa (em ficar calada ou em fingir falas soltas) em entrar na correnteza de aceitação e provas acrobáticas de participar ou não participar, de ser gostado ou simplesmente uma indiferença: por que você seria importante (ou por que sua voz clamada) ao ponto de ser requisitada para algo, todos queremos isso: ser requisitados para preencher este vazio existencial (do mistério da vida e da morte) só nos resta viver...

Digo sou boa em consultoria de vida (hoje já tem emprego pra isso e se chama Life Coaching, algo como, "gerenciador de carreira" ou "treinando a sua vida") - aos amigos e aos profissionais já dei bastante (tb naquele sentido erótico, hehe) referências e aconselhamentos (filosóficos por vezes) - meus gritos são sempre de auxílio, porem pauso.


A pausa é - eu na arrogância da adolescência sempre* achando ser requisitada para algo ou alguém, seja festa ou mesmo aquela conversa da dúvida e medo da vida - agora não mais adolescente, não grito mais - me quedo a calar e quando falo sinto uma sensação de divino, de "transcendência", programadores existenciais da vida que inventaram a fala (e o grito).


Pauso. E nessa pausa sinto o tremor da solidão, da carência da festa, do encontro, da orgia linguística, da sensação de estar sendo escutado.


Aí (neste canto chamado instante do agora, confessional) dou o meu grito na escrita, no indizível, eu grito, no indizível eu grito como um fado e vivo, como que trocando de pele e criando meu casulo, na escrita, na masturbação (que não deixa de ser na escrita uma ação de autodesejo, um grito pra si mesmo) e na ocupação do tempo consigo mesma.


Afinal essa vida há de ser ocupada - o reconheço com asterisco é uma abertura de olhar o mundo e saber que o tempo corre entre o real da obrigação dos fatos (tirania da necessidade e tragicidade do mundo), vivo querendo outro, outro mundo, sim, de novo com um amante amado, distante idealizado, sonho no dia em que casarei com ele a mesma cidade, o mesmo entorno, a mesma cama, óh meu amado camarada.


Afinal, vos que me lês, com o que tu ocupas teu tempo? Sonhos? (de consumo, de amor ou de vida?) Trabalhas? Dedicas teu tempo a quê? 

A vida há de ser ocupada e na fala damos os nossos gritos: o grito de resistência, escolho escolhendo, vivo vivendo, com a consciência de que quem me aceita me aceita por tudo, não só pela superfície, aparência imagem incoerência que dá gozos instantâneos e falseados pelo passar do tempo, o que perdura, não se interessa mais...



Eu ainda escolho o grito da sinceridade de pensar, fazer e escolher a vida que se quer: soy amante, amante do eros filosófico, prazer de pensar, prazer de conversar, é nisso que ocupo meu tempo, produzo realidades de troca e re-troca, reconheço... escolho - sabendo que a superficialidade faz de sua fofoca um processo de exclusão.


A arte de dar um grito é um canto, uma poesia, um lamento, um fado, queda de ser ilusão, "te confundo pra te esclarecer, te esclareço pra te confundir", Tom Zé é a arte do grito.


À exclusão, à hierarquia, aos problemas do quotidiano, um solene grito de fado, um grito de foda-se acarinhado com violas e uma dança doce.



(aberta a chamadas de festas e conversas pessoais, sou ótimo ouvido e ainda guardo segredo, com isso não grito)

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